- Assistência e Proteção no Protocolo contra o Tráfico Ilícito de Migrantes
- Olhar além do Protocolo: Direito Internacional dos Direitos Humanos e Direito dos Refugiados
- Grupos vulneráveis
- Obrigações positivas e negativas do Estado
- Identificação de migrantes em situação irregular e primeiras respostas
- Participação de migrantes em situação irregular nos processos judiciais
- O papel de organizações não governamentais (ONG)
- Proteção de migrantes em situação irregular vis-à-vis outras categorias de migrantes
- Medidas de curto, médio e longo prazo: responsabilidades, papéis e responsabilização
Este módulo é um recurso para professores
Identificação de migrantes em situação irregular e primeiras respostas
Como salientado no Módulo 5, os indivíduos são geralmente induzidos a migrar irregularmente devido a condições difíceis e instáveis nos seus países de origem. As perceções erradas quanto às causas da migração irregular podem levar a que os migrantes recebam pouca ou nenhuma assistência, o que compromete não só os seus direitos humanos, mas também, em alguns casos, a investigação bem-sucedida e a acusação daqueles que os introduziram ilegalmente. Os migrantes em situação irregular podem também ser requerentes de asilo, refugiados, apátridas e vítimas de crimes, nomeadamente tráfico de pessoas. É fundamental identificar com precisão as necessidades específicas de proteção dos migrantes para garantir que recebam assistência apropriada. Isto requer não apenas medidas legislativas adequadas, mas também a formação satisfatória de profissionais, processos de identificação robustos, procedimentos de encaminhamento reforçados e mecanismos de acompanhamento para garantir que os processos e procedimentos sejam realizados de acordo com as melhores práticas. Nos procedimentos de identificação é extremamente importante prestar atenção às pessoas com necessidades especiais, por exemplo, aquelas que são atribuíveis à sua idade ou género. Estes esforços exigem o pleno respeito e aplicação do quadro internacional dos direitos humanos, como já foi previamente explicado.
Como já mencionado no Módulo 1, tem havido uma tendência para promover a interceção de operações de tráfico de migrantes antes da chegada efetiva ao Estado de destino pretendido, descrito por alguns como “externalização das fronteiras”. Em geral, o artigo 11(1) do Protocolo contra o Tráfico Ilícito de Migrantes evidencia que os controlos fronteiriços destinados a prevenir e detetar a introdução clandestina de migrantes devem ser “sem prejuízo dos compromissos internacionais em relação à livre circulação de pessoas”. O artigo 19 (1) exige que as medidas de controlo fronteiriço tenham em consideração outras obrigações internacionais impostas ao Estado em causa, incluindo as obrigações da Convenção de 1951 relativa ao Estatuto dos Refugiados e ao seu Protocolo de 1967, enquanto o parágrafo 2 exige o respeito do princípio da não-discriminação na aplicação do Protocolo contra o Tráfico Ilícito de Migrantes.
Neste contexto, os procedimentos de saída e de entrada não devem discriminar em matéria de raça, religião, sexo ou deficiência. O ACNUR defende a utilização dos chamados sistemas de entrada "sensíveis à proteção". Trata-se de sistemas que têm em conta as necessidades de proteção e o dever dos Estados de respeitarem as suas obrigações nos termos do direito internacional dos direitos humanos e dos refugiados, incluindo o princípio da não-devolução. Os sistemas de entrada sensíveis à proteção asseguram que as medidas de controlo legítimas não sejam aplicadas arbitrariamente e permitam que os requerentes de asilo, e outros grupos com necessidades específicas de proteção, sejam identificados e tenham acesso a um território onde as suas necessidades possam ser devidamente avaliadas e tratadas. Assim, os direitos humanos e as obrigações humanitárias devem ser considerados por aqueles que trabalham nos procedimentos de controlo e identificação fronteiriços, principalmente porque são suscetíveis de ser os primeiros funcionários do Estado a encontrar os migrantes introduzidos ilegalmente. Os direitos relevantes neste contexto incluem o direito de todas as pessoas deixarem qualquer país, incluindo o seu, e o direito de todas as pessoas pedirem asilo e outros meios de proteção internacional. Os pedidos de proteção devem ser devidamente avaliados numa base casuística. Daí, mais uma vez, a importância de procedimentos de identificação e encaminhamento simplificados e eficientes.
O facto de os casos de tráfico ilícito de migrantes poderem facilmente transformar-se em situações de tráfico de pessoas evidencia ainda a importância dos procedimentos de identificação eficazes. Os oficiais da linha da frente ou os funcionários fronteiriços não terão necessariamente a capacidade de diferenciar imediatamente entre as várias categorias de migrantes introduzidos ilegalmente (por exemplo, requerentes de asilo e vítimas de tráfico). Por conseguinte, terão de as encaminhar para as autoridades competentes que tenham capacidade para proceder à identificação de forma rápida e eficaz. Para esse efeito, é fundamental desenvolver orientações robustas, procedimentos operacionais padronizados e medidas de formação, complementadas por fortes disposições institucionais que garantam uma cooperação e uma coordenação eficazes entre todos os intervenientes relevantes.
Caixa 32
Se os direitos humanos das pessoas rotuladas como "contrabandeadas" não forem reconhecidos, isto significa que os direitos de algumas pessoas traficadas e que não sejam identificadas também não o são. Não podemos ignorar as medidas anti tráfico que afetam as pessoas com quem trabalhamos. Global Alliance against Traffic in Women (GAATW), Human Rights in Migrant Smuggling (2011). |
Box 33
Lacuna de Proteção: identificar migrantes em situação vulnerávelPara além dos migrantes com condições médicas críticas, muito poucos migrantes receberam assistência imediata e cuidados médicos especiais e/ou encaminhamento aos serviços apropriados. O processo de identificação baseou-se, em grande parte, em vulnerabilidades visivelmente percetíveis, ou seja, mulheres visivelmente grávidas e pessoas com deficiências visivelmente aparentes conseguiram aceder ao apoio necessário, enquanto as mulheres que estavam na fase inicial da sua gravidez, pessoas com deficiências psicossociais, e sobreviventes de traumas ou violência sexual ou de género mas sem cicatrizes facilmente visíveis e que hesitavam em se autoidentificar, muitas vezes não eram identificadas. Muitos relataram que as perguntas das autoridades tinham com frequência o único objetivo de estabelecer um eventual pedido de asilo e que, nalguns países, eram feitas à pressa e com pouca informação significativa disponibilizada aos migrantes. Além disso, as equipas observaram que os procedimentos de identificação não eram realizados de forma consistente em todos os países ou instalações e que havia falta de procedimentos e/ou orientações estabelecidos sobre as normas aplicáveis. As equipas constataram, assim, que os mecanismos de identificação dos migrantes em situações vulneráveis eram predominantemente inadequados. Um obstáculo adicional à realização de rastreios de vulnerabilidade adequados foi a escassez de pessoal treinado dedicado a realizar rastreios e avaliações de vulnerabilidades e a responder apropriadamente às necessidades de proteção. As equipas constataram que, em muitos casos, um número insuficiente de pessoal qualificado resultou na falta de cuidados de saúde física e mental adequados, incluindo assistência psicossocial e aconselhamento e serviços de saúde sexual e reprodutiva acessíveis (por exemplo, serviços de contraceção de emergência e de aborto, cuidados de saúde materna). OHCHR, In Search of Dignity - Report on the Human Rights of Migrants at Europe's Borders (2017). |
Seguinte: Participação de migrantes em situação irregular nos processos judiciais
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