Este módulo é um recurso para professores 

 

Casos Práticos

Caso Prático 1 (Estados Unidos vs. Viktor Bout)

O traficante de armas russo, Viktor Bout, foi preso na Tailândia em 2008, pela Royal Thai Police. Em 2010, Bout foi extraditado para os Estados Unidos, para ser julgado pelo crime de terrorismo, depois de ter sido acusado de tentativa de tráfico ilícito de armas para as Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia (FARC) para serem usadas contras as forças Americanas. Ainda que o Ministério Público tenha defendido que fosse aplicada a pena de prisão perpétua, argumentando que o tráfico ilícito de armas de Bout potenciou os conflitos armados pelo mundo, Viktor Bout foi condenado a uma pena efetiva de 25 anos pelo Tribunal Federal de Manhattan pelos crimes de: (a) conspirar para matar cidadãos americanos (em violação do 18 U.S.C. § 2332(b)), funcionários e colaboradores (em violação do 18 U.S.C. §§ 1114 and 1117), por negociar a venda de armas para informadores no tráfico de droga que ele acreditava serem membros das Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia, uma organização terrorista conhecida como FARC; (b) conspirar para adquirir e exportar mísseis antiaéreos superfície-ar (em violação do 18 U.S.C. § 2332g)); e (c) conspirar para prestar apoio ou recursos à referida organização terrorista (em violação do 18 U.S.C. § 2339B).

De acordo com diversas fontes, Bout fomentou conflitos internacionais com o tráfico ilícito de armas. Ele dirigia empresas de transporte aéreo, que operavam predominantemente em África e no Médio-Oriente em meados dos anos noventa e no início dos anos de 2000. Ele operava, por exemplo, em diversos países, sob sanções das Nações Unidas, como a Libéria, Angola, Afeganistão, Iraque e Sudão. A sua empresa, Air Cess, em conjunto com outra empresa afiliada, Air Pass, eram conhecidas como tendo estado envolvidas no contrabando de bens da África do Sul para as áreas controladas pela União Nacional para a Independência Total de Angola (UNITA), enquanto ele esteve localizado nos Emirados Árabes Unidos. Considerando, em parte, a estreita relação com o antigo Presidente da Libéria, Charles Taylor, Bout e o seu associado Chichakli, foram sujeitos a sanções pelo Conselho de Segurança das Nações Unidas (CSNU), que incluíram restrição de viagens e da realização de negócios pelo mundo. De acordo com o Comité de Sanções relativo à Libéria da CSNU, Bout “apoiou o regime do antigo Presidente Taylor num esforço de destabilizar a Serra Leoa e obter acesso ilícito a diamantes”. O Comité de Sanções também enfatizou que Chichakli, “um colaborador/ associado” de Bout, desempenhava “um papel significativo no auxílio [de Bout] à criação e gestão de várias das suas empresas principais e na movimentação de dinheiro.” Como resultado das resoluções e do regime de sanções da CSNU, todos os Estados Membros das Nações Unidas foram orientados para congelar quaisquer fundos, ativos financeiros, e recursos económicos que fossem propriedade, ou controlados por Bout, ou Chichakli.

Bout foi condenado a 5 de Abril de 2012 a 25 anos de prisão efetiva, e foi transferido para a Penitenciária dos Estados Unidos em Marion, no Illinois, em Junho de 2012.

Processos relacionados

 

Características significativas

  • Relação entre comércio ilícito e terrorismo
 

Questões para discussão

a) Quais foram alguns dos principais clientes de Bout, e quais os seus maiores negócios?

b) Quais os crimes específicos cometidos por Bout, e por quais crimes foi acusado? Qual a razão pela qual Bout forneceu apoio material a organizações terroristas?

c) Quantos diplomas legais, nacionais e internacionais, foram relevantes para o caso?

d) Quais foram os principais desafios durante a investigação, e acusação, no processo de Viktor Bout?

Caso Prático 2 (Crime de Colarinho Branco)

Jonathan Lebed interessou-se pelo mercado de ações quando ele, e outros dois colegas, competiam num torneio de seleção de ações durante o período da Escola Secundária. Posteriormente, ele elaborou um esquema para ganhar dinheiro, trabalhando a partir do seu próprio quarto. Usando contas de bolsa criadas pelo pai, ele adquiriu eletronicamente ações a baixo custo que estavam a ser negociadas nas bolsas de valores. Depois inundava os fóruns da Internet com mensagens falsas ou enganosas que criavam a impressão de que estas ações baratas rapidamente teriam valorização. Mensagens como “Stock líquido para ganhar 1000%”, combinadas com histórias falsas em que se assumia como presidente da empresa, criavam a ilusão de que ele teria informação interna sobre essas ações, de baixo custo, que as empresas emitiam. Para evitar ser identificado ou ser revelada a fonte das mensagens, ele usava nomes fictícios, quando postava as mensagens enganosas sobre as ações baratas que havia comprado.

Assim que os preços das ações subissem em resposta às suas mensagens, Lebed vendia as suas ações com lucro imediato. De acordo com a investigação, por cada transação, Lebed obteve um lucro entre $11.000,00 a $70.000,00 dólares americanos. Por fim, foi acusado de manipular o mercado de ações pela internet e ganhar $273.000,00 dólares americanos em lucros ilícitos. Foi alcançado um acordo no processo, e ele aceitou pagar ao Governo $285.000,00 dólares americanos.

Casos relacionados

 

Características significativas

  • Manipulação do mercado de ações em larga escala
 

Questões para discussão

a) Explique se caraterizaria este esquema como um crime de colarinho branco, ou criminalidade organizada?

b) Como é que a Convenção Contra a Criminalidade Organizada pode ser usada para estabelecer a diferença entre essas duas formas de crime?

Caso Prático 3 (Estados Unidos vs. Juan Almeida)

Em janeiro de 1997 Juan Almeida (Cubano), Leonid “Tarzan” Fainberg (Ucraniano) e Nelson “Tony” Yester (Cubano) foram presos na Flórida, EUA, e acusados de conspiração para o tráfico de cocaína. Yester estava em parte incerta por altura do julgamento. A conspiração abrangeu três empreendimentos entre 1986 e 1995. O primeiro ocorreu no final dos anos de 1980, quando Almeida, e o fugitivo co-autor Nelson “Tony” Yester, coordenavam o transporte de várias remessas de cocaína de Miami para Nova Iorque. O segundo, que talvez tenha sido o que lhes granjeou mais fama, envolveu a tentativa de adquirir um submarino da II Guerra Mundial da antiga União Soviética. O submarino seria usado pelos associados de Pablo Escobar para introduzir cocaína da América do Sul, na costa oeste dos Estados Unidos, em São Francisco. O terceiro envolveu um plano para ocultar cocaína em transportes de camarão para a Rússia. A testemunha “estrela” do governo em relação ao submarino e ao transporte de camarão, foi Leonid “Tarzan” Fainberg.

O Mafioso ucraniano Leonid “Tarzan” Fainberg, nasceu em Odessa, e saiu da União Soviética no início dos anos 1980 para Israel e mais tarde, com a queda da União Soviética, mudou-se para os Estados Unidos. De 1992 a 1997, a atividade criminosa de Fainberg incluia extorsão, branqueamento de capitais, contrafação de moeda, tráfico de meninas da Rússia para as forçar a trabalhar como strippers ou prostitutas, importação e distribuição de narcóticos, como cocaína e heroína, da América do Sul para os Estados Unidos, Rússia e outros lugares.

Este caso revela como os grupos criminosos organizados podem construir relações de benefício mútuo. Também demonstra o papel dos intermediários para a facilitação de parcerias entre vários grupos criminosos organizados. Finalmente, este processo é ilustrativo da mobilidade criminal dentro das fronteiras nacionais, e a complexidade das conspirações criminosas.

Casos relacionados

 

Características significativas

  • Colaboração entre grupos criminosos
 

Questões para discussão

a) Por que razão grupos anteriormente concorrentes decidem estabelecer parcerias? Que papel desempenham os intermediários na ligação entre diferentes grupos criminosos organizados?

b) O que significam estas parcerias criminais para a eficiência da execução das operações policiais contra esta criminalidade, e a capacidade da polícia se infiltrar e cessar a atividade?

Caso Prático 4 (AQIM)

Mokhtar Belmokhtar foi fortemente criticado pela Al-Qaeda Islâmica do Magrebe (AQIM) quando fazia parte do seu grupo, por levar a cabo mais atividades geradoras de rendimentos do que atividades da agenda religiosa e política do grupo. Afastado do grupo, começou a sua própria organização terrorista, a Katibat El-Moulathamoune (o Batalhão Assinado-a-Sangue), e continuou a sua atividade de comércio ilícito, nomeadamente, de tabaco.

Em 2003, a Organização das Nações Unidas considerou Belmokhtar como membro da AQIM, e o Departamento do Tesouro dos Estados Unidos integrou-o na lista de financiadores de uma organização terrorista. Foi alegado que Belmokhtar liderou um ataque à exploração internacional de gás Tiguentourine, em Amenas, Argélia, no qual morreram, pelo menos, 38 pessoas. Em 2003, liderou o rapto de 32 turistas Europeus que, com sucesso, conseguiu o respetivo resgate. Para financiar estas atividades terroristas e, em sentido mais amplo, a própria existência da sua organização terrorista, Belmokhtar usou uma antiga rota de sal da tribo Tuaregue para transportar bens da Costa Oeste Africana para Timbuktu no Mali, através do Níger, antes de chegar ao sul da Argélia. Estabelecendo laços estreitos com os membros da tribo Tuaregue, através do casamento com as filhas de quatro das famílias mais proeminentes, obteve grandes lucros para a AQIM (quando ainda fazia parte da organização), pelo contrabando de tabaco, armas, drogas e tráfico de pessoas. O seu grande envolvimento no comércio ilícito de tabaco, tornaram-no conhecido em todo o Sahara como “Sr. Marlboro.”

Em Junho de 2004, um tribunal em Illizi, na Argélia, condenou Belmokhta in absentia, a prisão perpétua pela organização de grupos terroristas, roubo, detenção e uso ilegal de armas. Em Março de 2007, Belmokhtar foi condenado in absentia por um tribunal criminal na Argélia a 20 anos de prisão por organização de grupos terroristas, rapto de estrangeiros, importação e tráfico ilícito de armas ilegais. Em Março de 2008, o tribunal de Ghardaïa, na Argélia, condenou, Belmokhtar, in absentia, a uma pena de prisão perpétua pelo homicídio de 13 funcionários da alfândega. Mokhtar Belmokhtar está ativo no norte do Mali, e entre outros crimes, esteve envolvido no rapto de dois diplomatas Canadianos que trabalhavam para as Nações Unidas, em Dezembro de 2008. De acordo com algumas fontes, Belmokhtar terá sido morto nos arredores de Ajdabiya, no este da Líbia, por uma unidade de militares dos EUA encarregada de perseguir a al-Qaeda em 2015.

Casos relacionados

 

Características significativas

  • Financiamento do terrorismo pelo contrabando de tabaco
 

Questões para discussão

a) Qual a natureza do envolvimento de Belmokhtar no comércio ilícito?

b) Porque é que alguns dos seus companheiros na organização terrorista não gostavam dele?

c) Quais são as limitações do envolvimento terrorista no comércio ilícito?

Caso Prático 5 (Pornografia Infantil; R. v Way)

O processo canadiano R. v Way envolveu 176 filmes produzidos pela empresa de Brian Way, a Azov Films. O Ministério Público alegou que as imagens estavam relacionadas com pornografia infantil, mas Way defendia que eram cenas de nus artísticos com modelos infantis masculinos. O arguido defendeu-se alegando que não havia atos de carácter sexual nesses filmes, encontrados nos escritórios da empresa. A questão principal a ser respondida em tribunal, era se o material em questão era pornografia infantil, conforme definido no Código Penal Canadiano (Secção 163.1 (1) (ii)), no âmbito do qual o elemento típico essencial de pornografia infantil era a “representação, para fins sexuais, de membro sexual ou da região anal de uma pessoa com idade inferior a oito anos”. Outra questão era estabelecer se os membros da empresa de Way constituíam um grupo criminoso organizado.

O tribunal fez notar que a Azov Films era sofisticada e teve uma rápida expansão internacional. O website tinha um texto jurídico em que fazia induzir que o material era legal, tanto no Canadá, como nos Estados Unidos da América. Tinha uma lista ou catálogo on-line com a função pesquisa, e um sistema de pagamento comum. O material podia ser descarregado, ou ser entregue uma cópia em disco por correio ou por estafeta. Da lista de clientes da Azov Films, incluindo detalhes da coleção encontrada em casa do arguido, resultou a expansão da investigação à medida que outros casos mais graves, de abuso sexual de crianças e pornografia infantil, foram revelados. Centenas de crianças em risco foram identificados por todo o mundo, e centenas de adultos espalhados por vários continentes foram presos, após altos níveis de cooperação internacional entre as polícias.Enquanto o arguido argumentava que as crianças ou os rapazes eram modelos, o tribunal examinou os elementos típicos da legislação, para confirmar que a nudez sexualizada das crianças se subsumiam na definição de pornografia infantil. Fazendo isto, também confirmou que a pornografia infantil, na extremidade inferior da escala (em termos de gravidade), constitui pornografia infantil para os fins do Código Penal Canadiano. Notavelmente, e ainda que no caso concreto nenhum ato sexual foi perpetrado diretamente nas cerca de 40 crianças (maioritariamente da Roménia e Ucrânia), o tribunal atribuiu significado aos sentimentos de vergonha e depressão que os rapazes sofreram. Observou-se que os rapazes se sentiram desonrados quando se aperceberam que os filmes eram vendidos pelo mundo; alguns sofreram ansiedade e agitação. Os filmes estavam à venda em 92 países diferentes. Pelo menos um dos rapazes estava preparado para aparecer em filmes pornográficos para adultos, também distribuídos pela mesma empresa, quando fizesse 18 anos.

O tribunal concluiu para além da dúvida razoável que, tendo em conta as poses de cariz sexual, os tipos de atividades em que se envolviam, o website em que os filmes eram vendidos (o elemento comum é a venda de filmes que retratem meninos e homens nus), as fotografias gráficas que acompanhavam alguns dos filmes, e as comunicações de Way, relativas ao seu desejo de aumentar a sua clientela base, o espectador médio consideraria que as representações eram para uma finalidade sexual. Em suma, o tribunal ficou convencido que a característica dominante dos filmes era a representação dos órgãos genitais e da zona anal dos meninos, e para um fim sexual, pelo que os filmes são de pornografia infantil.

O Ministério Público também argumentou que a empresa devia ser considerada como um grupo criminoso organizado. Não obstante, os factos não se subsumiam neste caso, com a definição, uma vez que os indivíduos eram colaboradores, incluindo a mãe de Way que constava da lista de empregados como tesoureira da empresa e administradora, cameraman e editora. Para além disso, não foi produzida prova em relação: (a) as regras da organização; (b) a inter-relação entre as partes do alegado grupo criminoso organizado; (c) o conhecimento pelos colaboradores do Sr. Way sobre o que é que outros membros da organização faziam para o grupo criminoso organizado. O tribunal também considerou o facto que a companhia cinematográfica também produzia outros filmes que não eram ilegais, o que complicou, assim, a identificação do benefício financeiro ou outro benefício material – a mens rea é necessária como prova de um grupo criminoso organizado. Assim, o tribunal acabou por concluir que não foi produzida prova para além da dúvida razoável, de que a organização tinha uma estrutura necessária para se constituir como um grupo criminoso organizado.

Ainda que a Azov Films não fosse considerada como um grupo criminoso organizado, a culpabilidade de Way foi ligada à coleção privada que mantinha em sua casa (com 187,001 imagens únicas e 8,747 vídeos únicos) e que ele também partilhava. No entanto, Way foi condenado em 15 acusações relacionadas tanto com a produção e venda de pornografia infantil, como pela sua coleção pessoal de pornografia infantil. Não foi considerado culpado por instigar outros na importação, produção, distribuição e exportação de pornografia infantil em benefício do grupo criminoso organizado.

Em Agosto de 2016 foi condenado a 10 anos de prisão efetiva e uma multa de $20,000. Foi obrigado a registar-se como criminoso sexual; fornecer amostra de ADN para análises forenses; e foi proibido de ir a parques públicos ou áreas de piscinas públicas frequentadas, ou que razoavelmente pudessem ser frequentadas, por crianças com menos de 16 anos, creches, escolas, recreios ou centros comunitários; procurar, conseguir ou continuar em qualquer emprego, ou tornar-se voluntário em qualquer atividade que envolva uma posição de confiança ou autoridade sobre crianças com menos de 16 anos. Para além disso, foi proibido de usar o computador para comunicar com qualquer pessoa com menos de 16 anos. Esta pena acessória foi estabelecida pelo período de 10 anos após a libertação de Way.

Casos relacionados

 

Características significativas

  • Moda infantil sexualizada, interpretações artísticas e interações com pornografia infantil
  • Elementos constitutivos de um grupo criminoso organizado
 

Questões para discussão

  • Como se pode distinguir pornografia infantil de modelos infantis?
  • Como é definido um grupo criminoso organizado na Convenção das Nações Unidas contra a Criminalidade Organizada Transnacional?
  • Quais os elementos, neste processo, que o tribunal considerou para determinar se a empresa constituía um grupo criminoso organizado?
 
Seguinte: Pensando criticamente através da ficção
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