Este módulo é um recurso para professores
Cooperação internacional e troca de informações
Tanto a UNTOC quanto o Protocolo de Armas de Fogo identificam o objetivo principal de promover, facilitar e fortalecer a cooperação entre os Estados para enfrentar e prevenir a criminalidade organizada transnacional (UNODC, 2018b).
As disposições da UNTOC são amplas e incluem a execução da lei internacional, a cooperação judicial e o intercâmbio de informações em questões criminais com o objetivo de prevenir, investigar e processar a criminalidade organizada transnacional. Ao contrário de outros instrumentos internacionais, a UNTOC pode servir de base jurídica para essa cooperação na ausência de um tratado bilateral formal, quando esse nível de formalidade for exigido entre dois ou mais Estados-parte.
O tráfico de armas de fogo é um crime típico que envolve um elemento transnacional e cuja investigação completa pode exigir a cooperação de uma ou mais autoridades estrangeiras, a fim de reunir as provas e informações relevantes necessárias para investigar e processar judicialmente a atividade de tráfico ilícito.
Isso pode exigir a identificação do vendedor das armas em outro país, reunindo a prova de que o fornecedor vendeu as armas a uma terceira pessoa ilegalmente ou com intenção de que as armas fossem destinadas ao tráfico para outro país. Pode exigir a verificação de contas bancárias e transações financeiras, ou apreensão de contas bancárias estrangeiras, e pode exigir a identificação e audiência de testemunhas em ambos os países, a fim de provar a ligação entre o vendedor em um país, o traficante e o usuário final em outro país.
Cooperação Formal ou Judicial
Obter a prova de que alguém vendeu uma arma de fogo para fins de tráfico, ou que outra pessoa possuiu uma arma de fogo pelo mesmo motivo não é algo fácil de se conseguir, e tal informação só pode ser obtida por meio de técnicas especiais de investigação no país de origem; por exemplo, usando agentes disfarçados para realizar compras falsas ou vigilância de contas de e-mail e escuta telefônica de conversas telefônicas. Frequentemente, isso pode justificar a abertura de uma investigação paralela em ambos os países onde parte dos crimes foram cometidos com o objetivo de trocar informações e provas entre as autoridades de ambos os países.
Muitas dessas medidas requerem autorização e controle judicial, especialmente se uma autoridade estrangeira estiver solicitando as informações. Este tipo de cooperação é obtido através de um mecanismo mais formal denominado “cooperação judiciária”, exemplos do qual incluem, mas não se limitam a:
- Assistência legal mútua (MLA);
- Extradição;
- Transferência de processos criminais; e
- Transferência de pessoas condenadas.
O Artigo 18 da UNTOC prevê um quadro de cooperação muito amplo e exige que os Estados-parte proporcionem uns aos outros a medida mais ampla de assistência jurídica mútua aplicável a todos os crimes que se enquadram no âmbito da Convenção e seus Protocolos, sempre que houver motivos razoáveis para suspeitar que o crime é de natureza transnacional e envolve um grupo criminoso organizado. Em outras palavras, ao buscar ajuda de outro país, as autoridades nacionais não precisam provar o elemento transnacional; é suficiente que haja motivos razoáveis para acreditar que tal elemento existe ou pode surgir como resultado da assistência solicitada.
O tipo de assistência que os países podem necessitar é muito amplo e abrangente, e inclui, entre outros (artigo 18 da UNTOC, também chamado de mini-tratado, já que a Convenção pode ser usada como base legal para facilitar essa cooperação):
- Serviço de documentos judiciais;
- Execução de buscas, apreensões e congelamento;
- Exame de objetos e sites;
- Fornecimento de informações e evidências;
- Disponibilização de documentos e registros;
- Identificação de itens de evidência;
- Identificação e rastreamento de receitas e propriedades para evidência;
- Obter provas ou declarações de pessoas;
- Facilitar aparições voluntárias;
- Transferência temporária de pessoas sob custódia, etc.
A extradição é o tipo de cooperação mais invasivo e formal; prevê a entrega, por um Estado, de uma pessoa presente em seu território a outro Estado que a busque para julgamento ou execução de sentença. A extradição de uma pessoa está sujeita a diversas condições e limitações a fim de preservar seu habeas corpus e não infringir direitos humanos fundamentais. Ao contrário do MLA, a extradição está sujeita à noção de dupla incriminação, o que significa que o crime pelo qual um país solicita a entrega de uma pessoa por outro país deve ser considerado um crime também no país requerido. Muitos países exigem a conclusão de um acordo bilateral específico entre os dois países ou podem decidir aplicar a UNTOC como base jurídica. Todas as infrações da Convenção e do Protocolo devem ser consideradas como extraditáveis e, portanto, estar sujeitas à cooperação entre as Partes.
O Módulo 11 da Série de Módulos Universitários E4J sobre Criminalidade Organizada aborda em detalhes essas formas de cooperação. Além disso, o Módulo 9 da Série de Módulos Universitários E4J sobre Armas de Fogo analisa mais detalhadamente as várias formas de cooperação internacional ligadas especificamente a questões de controle de armas de fogo.
O Protocolo de Armas de Fogo da ONU complementa a Convenção e amplia ainda mais essas disposições. O objetivo do Protocolo de Armas de Fogo “é promover, facilitar e fortalecer a cooperação entre os Estados-parte a fim de prevenir, combater e erradicar a fabricação e o tráfico ilícitos de armas de fogo, suas peças e componentes e munições” (UNODC, 2001: 2).
Os Estados signatários do Protocolo devem cooperar nos níveis bilateral, regional e internacional, estabelecer pontos de contato nacionais sobre questões relacionadas ao Protocolo e buscar o apoio e a cooperação de fabricantes, negociantes, importadores, exportadores, corretores e transportadores comerciais de armas de fogo, suas partes e componentes e munições para prevenir e detectar a fabricação e o tráfico ilícito de armas de fogo, suas peças e componentes e munições. Os Estados-parte também são obrigados a identificar um órgão nacional ou um ponto focal para fazer a ligação com outros Estados em questões relativas ao Protocolo de Armas de Fogo (Artigo 13).
Troca de Informações
Para construir um caso de investigação internacional, os sistemas nacionais de justiça criminal devem muitas vezes identificar e obter informações de provas do exterior. O Protocolo de Armas de Fogo encoraja os Estados a trocar informações com outros Estados que sejam consistentes com seus respectivos sistemas nacionais, legais e administrativos. O tipo de informação normalmente está relacionado aos seguintes tópicos:
- Informações específicas de casos sobre produtores, distribuidores, importadores, exportadores autorizados e, sempre que possível, portadores de suas armas de fogo, suas peças, componentes e munições;
- Grupos criminosos organizados conhecidos ou suspeitos de participação na fabricação ou tráfico ilícito de armas de fogo, suas peças e componentes e munições;
- Os meios de dissimulação utilizados na fabricação ou tráfico ilícito de armas de fogo, suas peças, componentes e munições, e as formas de detectá-los;
- Métodos e meios, pontos de envio, destino e rotas habitualmente utilizadas por grupos criminosos organizados envolvidos no tráfico ilícito de armas de fogo, suas peças e componentes e munições; e
- Experiências e práticas legislativas, e medidas para prevenir, combater e erradicar a fabricação e o tráfico ilícitos de armas de fogo, suas peças e componentes e munições.
Os Estados-parte também são incentivados a trocar informações científicas e tecnológicas relevantes que sejam úteis às autoridades responsáveis pela execução da lei, a fim de aprimorar as habilidades uns dos outros para prevenir, detectar e investigar a fabricação e o tráfico ilícitos de armas de fogo, suas peças e componentes e munições, e para processar as pessoas envolvidas nessas atividades ilícitas (artigo 12.º, nº 3). Devem cooperar na localização de armas de fogo, suas peças e componentes e munições que possam ter sido fabricadas ou traficadas ilegalmente (Artigo 12 (4)).
Parte da cooperação internacional é também a prestação, mediante solicitação, de treinamento e assistência técnica necessária para aumentar a capacidade dos Estados-parte de prevenir, combater e erradicar a fabricação e o tráfico ilícitos de armas de fogo, suas peças e componentes e munições, incluindo assistência técnica, financeira e material (artigo 14.º).
Outras Formas de Cooperação para Execução da Lei
Para além dos mecanismos formais de cooperação jurídica, é importante desenvolver uma cooperação ao nível do trabalho e contatos com instituições parceiras responsáveis pela investigação e repressão da corrupção em outros países. O convívio regular com outros profissionais que trabalham nesta área da execução da lei permite a troca de experiências e o estabelecimento de contatos. Essa rede pode finalmente levar ao desenvolvimento de uma comunidade de profissionais capazes de trocar informações em primeira mão para uso no processo investigativo ou definir as bases para uma cooperação formalizada adicional. Por exemplo, informações sobre um suposto grupo de tráfico de armas de fogo em um país vizinho podem ser confirmadas ou negadas informalmente antes do início dos procedimentos de cooperação formal. Essa cooperação informal resulta numa economia de tempo e agrega valor operacional aos procedimentos de investigação ou ação penal.
Equipes de Investigação Conjunta
Equipes de investigação conjunta estão entre os meios de cooperação mais conhecidos no combate ao crime relacionado com armas de fogo. Uma equipe de investigação conjunta é um empreendimento colaborativo constituído com o objetivo de investigar uma infração penal complexa específica, de dimensão claramente internacional, que inclui peritos de autoridades competentes de dois ou mais Estados participantes. O objetivo desta técnica é maximizar a eficiência dos recursos investigativos de duas ou mais jurisdições por meio da troca de informações em tempo real e, se necessário, de operações.
Investigações paralelas, ou equipes de investigação conjuntas, são medidas particularmente úteis e promissoras para lidar com crimes, como o tráfico internacional, onde parte das provas e informações relevantes existem no país de origem ou destino do tráfico. Ao estabelecer investigações paralelas em ambos os países, ou mesmo, quando possível, equipes de investigação conjuntas, as provas são produzidas internamente (portanto, mais rápida e mais facilmente do que por meio de solicitações de cooperação internacional) e podem ser trocadas por meio de mecanismos de cooperação informal quando necessário.
Seguinte: Processamento e julgamento do tráfico de armas de fogo
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