Mais de 750 mil audiências de custódia foram realizadas no Brasil entre 2015 e 2020. A iniciativa prevê que toda pessoa presa seja obrigatoriamente apresentada a uma autoridade judicial num prazo de 24 horas, conforme previsto na Resolução nº 213/2015 do Conselho Nacional de Justiça (CNJ).
As audiências de custódia são um instrumento indispensável para análise da legalidade e necessidade de manutenção das prisões até o julgamento. Segundo o Departamento Penitenciário Nacional (Depen), ao menos 30% das mais de 745 mil pessoas atualmente privadas de liberdade no Brasil são presos provisórios.
Desde 2019, o CNJ trabalha em parceria com o Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD) e com o Escritório das Nações Unidas sobre Drogas e Crime (UNODC) para apoiar os tribunais no fortalecimento e expansão da audiência de custódia em todo o país. Esta é uma das 28 ações simultâneas desenvolvidas pelo programa Fazendo Justiça para superação de desafios estruturais no contexto de privação de liberdade, programa que tem o apoio do Depen.
Um dos principais resultados desse esforço é a institucionalização dos serviços de Atendimento à Pessoa Custodiada (Apecs), já presentes em 20 estados. A iniciativa do CNJ investe na expansão da oferta de serviços com foco em proteção social já oferecidos em alguns estados e na adoção de parâmetros que qualificam o atendimento por meio do estímulo ao trabalho em rede e de enfoque restaurativo, articulando o acesso a serviços voltados a cuidado, cidadania e inclusão social. Em 2020, o CNJ formalizou a institucionalização do modelo Apec no Maranhão, Mato Grosso, Mato Grosso do Sul, Sergipe e Alagoas. A iniciativa de expandir o serviço continuará no primeiro semestre de 2021.
Alternativas penais - A metodologia do Atendimento à Pessoa Custodiada se apoia na Resolução CNJ nº 288/2019, que define a política institucional do Poder Judiciário para a aplicação de alternativas penais, e também na formação de redes de serviços por meio de convênios com órgãos públicos, universidades e a sociedade civil. A estratégia de fortalecimento dos Apecs conta com o apoio de consultores técnicos do UNODC alocados nas 27 unidades da federação através do programa Fazendo Justiça, para apoiar o judiciário local na construção de fluxos de trabalho e propostas de acordos de cooperação
A iniciativa ampliou o número de tribunais que passaram a oferecer atendimento social antes e depois das audiências de custódia e também na modalidade universal, ou seja, para todas as pessoas com alvará de soltura - relaxamento de prisão, liberdade provisória com ou sem cautelares, prisão domiciliar ou monitoração eletrônica. Em junho de 2019 apenas dois estados ofereciam de maneira universal o atendimento pré-audiência. Atualmente, a iniciativa já é adotada por 10 estados: Acre, Espírito Santo, Maranhão, Mato Grosso, Mato Grosso do Sul, Pará, Paraná, Piauí, Roraima e Sergipe.
No caso dos atendimentos pós-audiência, havia oferta universal em apenas seis unidades federativas e, de modo seletivo, em outras três. Hoje, o procedimento já alcança 20 estados, sendo que em 14 o atendimento é disponibilizado a todas as pessoas com alvará de soltura – como adotado por Alagoas, Amazonas, Bahia, Ceará, Espírito Santo, Mato Grosso, Mato Grosso do Sul, Pará, Pernambuco, Piauí, Rio de Janeiro, Roraima, Rio Grande do Sul e Sergipe. Outros seis ofertam atendimento pós-audiência em casos específicos, como é o caso de Distrito Federal, Minas Gerais, Paraná, Rio Grande do Norte, Maranhão e São Paulo.
Há também avanços na disponibilização de insumos como roupas e alimentação às pessoas custodiadas – serviço que era ofertado por sete estados e atualmente já chega a 14. O programa também articula o serviço na justiça federal: o Tribunal Regional Federal da 3ª Região, com sede em Guarulhos (SP) e que atende as prisões em flagrante ocorridas no maior aeroporto do país, deve inaugurar em breve o Apec.
Funcionamento - A participação no Serviço de Atendimento à Pessoas Custodiada é voluntária. No atendimento pré-audiência de custódia, uma equipe multidisciplinar – que conta com ao menos um profissional de serviço social e um de psicologia – apresenta à pessoa que foi detida o objetivo do serviço e coleta informações para identificar necessidades imediatas, como comunicação com a família. Em um segundo momento, é feita entrevista em que se levantam dados sobre moradia, documentação, família, trabalho, renda e acesso a benefícios sociais.
Com base nessas informações, é elaborado relatório para auxiliar a análise do magistrado quanto à manutenção ou não da prisão em flagrante, apontando, ainda, encaminhamentos para situações de vulnerabilidade identificadas, como uso de drogas, transtorno mental ou ausência de contato com a família. Os relatórios também são compartilhados com a defesa e com o Ministério Público.
Já o atendimento pós-audiência tem como objetivo auxiliar nos encaminhamentos à pessoa custodiada, como explicar os procedimentos relativos a medidas cautelares determinadas pelo juízo ou informações sobre acesso a políticas públicas. “Quando se dá oportunidade para a pessoa, através de um serviço de atendimento social e psicológico, dá-se também uma oportunidade que muitas vezes ela não teve”, aponta o juiz coordenador das audiências de custódia de Cuiabá, Marcos Faleiro.
É o que também defende o assistente social Pablo Cardozo, do Apec da comarca de São Mateus, no Espírito Santo, estado que tem um dos programas de atendimento à pessoa custodiadas mais antigos do país. “É possível notar que a resolução do CNJ implantando as audiências de custódia tornou a decisão judicial mais humana, diante da ponderação dos aspectos sociais do acoimado colhidos durante atendimento”, aponta.
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