Programa de Capacitação de lideranças indígenas promovido pelo UNODC Brasil fortalece os sistemas de vigilância e proteção territorial indígena na Amazônia

Lideranças indígenas aprimoram estratégias de vigilância e proteção territorial para enfrentar crimes ambientais na Amazônia

UNOCD apresenta projeto SAR-TI durante capacitação de lideranças indígenas em Boa Vista (RR)

Fevereiro de 2025, Boa Vista, RoraimaDiante das crescentes ameaças do crime organizado e da mineração ilegal na Amazônia, lideranças indígenas de diferentes etnias reuniram-se em Boa Vista (RR) para um programa de capacitação promovido pelo Escritório das Nações Unidas sobre Drogas e Crime (UNODC) do Brasil. O evento, realizado entre 11 e 14 de fevereiro, faz parte das atividades implementadas pelo projeto SAR-TI – Fortalecimento de Sistemas de Alerta Rápido e Respostas aos Crimes Ambientais relacionados à Mineração Ilegal do Ouro em Territórios Indígenas, apoiadpelo Ministério de Assuntos Estrangeiros e Cooperação Internacional (MAECI) do Governo da Itália. 

atividade foi desenvolvida em parceria com o Instituto de Pesquisa Ambiental da Amazônia (IPAM) com o apoio do Conselho Indígena de Roraima (CIR) e busca fortalecer os sistemas de monitoramento e vigilância territorial, promovendo a troca de experiências e ampliando a articulação entre os povos indígenas para a defesa de seus territórios. 

A principal ação do programa de capacitação, incluiu um exercício de avaliação dos sistemas autônomos de vigilância do povo Munduruku. A metodologia desenvolvida pelo UNODC tem como objetivo mapear as capacidades existentes, avaliar compatibilidades e propor adaptações que viabilizem a interação entre os sistemas indígenas de monitoramento e as plataformas de denúncias operadas por instituições governamentais. Além do povo Munduruku, foram analisados os sistemas de vigilância dos povos Kayapó, Yanomami e Ye’kwana, do Conselho Indígena de Roraima e do Coletivo do Pirarucu, que abrange 8 territórios indígenas no estado do Amazonas. Está prevista ainda a realização do exercício no território do Vale do Javari. 

Os resultados dessas avaliações serão apresentados no Grupo de Trabalho (GT) Interinstitucional de Vigilância para a Proteção Territorial Indígena, que reúne periodicamente mais de 20 instituições, entre representações dos povos indígenas, instituições do governo federal e sociedade civil 

O objetivo da capacitação foi fortalecer essa união entre os povos, a partir da troca de experiências sobre os processos de monitoramento e vigilância territorial que eles já realizam, e facilitar a criação de uma rede mais estruturada de alertas contra crimes ambientais, especialmente, a mineração ilegal em territórios indígenas 

Participantes da capacitação conhecem grupo de monitoramento e vigilância da Comunidade Indígena Boqueirão

Durante a capacitação de quatro dias, o líder indígena professor Ademir Munduruku e mais cinco lideranças das organizações do Alto Tapajós do povo Munduruku conheceram a estrutura do CIR, que há 54 anos trabalha para garantir os direitos e a autonomia das comunidades indígenas da região e apoia as práticas de vigilância realizadas pelos povos. 

Como parte das atividades, o grupo visitou a comunidade indígena Boqueirão, apoiada pelo CIRlocalizada acerca de cem quilômetros da capital, Boa Vista. A comunidade é uma das principais rotas de garimpeiros que se até as terras indígenas Yanomamipróximas dali, e possui um modelo avançado de vigilância territorial. Cerca de 700 pessoas das etnias Macuxi e Wapichana vivem em Boqueirão e sofrem com as consequências do garimpo, como poluição dos rios, contaminação dos peixes por mercúrio e outros produtos químicos oriundos do garimpo ilegal e da invasão de terras.  

A lista de impactos negativos do garimpo ilegal é extensa. Alexandre Viriato, coordenador do grupo de monitoramento e vigilância da Terra Indígena Boqueirãorelata que aqui nós enfrentamos também problemas de saúde, desmatamento, alcoolismoviolência, a presença de facções criminosas e dtráfico de drogas”. 

Alexandre e outros nove membros de sua família atuam como os guardiões do monitoramento do território. “Fazemos expedições periódicas, que podem durar semanas, para proteger nossas terras. Muitas vezes conseguimos impedir garimpeiros de invadirem e realizamos a denúncia ao CIR”. São por meio desses alertas e denúncias que as instituições governamentais competentes ficam cientes dos crimes que afetam os territórios indígenas, protegidos por lei. 

O projeto SAR-TI atua diretamente no fortalecimento de associações e organizações indígenas, instituições governamentais e da sociedade civil para a estruturação, fortalecimento e integração de mecanismos de preparação, monitoramento, vigilância, alerta rápido e resposta aos crimes ambientais e outros crimes em territórios indígenas na Região Amazônica brasileira. Essas ações reforçam o compromisso do UNODC no enfrentamento do crime organizado e dos crimes ambientais, em alinhamento com seu mandato global e com a Convenção das Nações Unidas contra o Crime Organizado Transnacional (Convenção de Palermo/UNTOC). 

A fim de conhecer outros sistemas de vigilância, as lideranças visitaram, ainda, a sede da Hutukara Associação Yanomami (HAY) e puderam conhecer os processos e sistemas de denúncia realizados por eles, atualmente a etnia mais atingida pelo garimpo ilegal no Brasil.  

Esse encontro abre a nossa mente e mostra que a gente pode voltar para a base com ideias novas de como combater não só o garimpo ilegal, mas outros crimes, relatou o professor Ademir no último dia do programa de capacitação.  

Participante do Programa de Capacitação, a líder e professora Mariza Kaba Munduruku

A líder e professora Mariza Kaba Munduruku também participou do encontro na capital de Roraima e relatou que, inicialmente, quando alertava a sua comunidade quanto aos perigos do garimpo ilegal, encontrava resistência  

“Mas, quanto mais eu buscava conhecimento, mais eu ganhava a confiança deles”, conta.  

“Esse programa de capacitação é uma inspiração e uma motivação. Eu vou voltar para o meu povo com novas ideias e compartilhar informação. Sabendo que existem pessoas ajudando a nossa causa, a gente se sente fortalecida e motivada em continuar esse trabalho”, destacou Mariza.  

SAR-TI – O SAR-TI é uma iniciativa do Escritório das Nações Unidas sobre Drogas e Crime (UNODC), apoiada pelo Ministério de Assuntos Estrangeiros e Cooperação Internacional (MAECI) do Governo da Itália. Tem como objetivo apoiar e fomentar a articulação de associações e organizações indígenas, instituições governamentais e da sociedade civil para a estruturação, fortalecimento e integração de mecanismos de preparação, monitoramento, alerta rápido e resposta aos crimes ambientais e outros crimes em territórios indígenas, com foco em áreas afetadas pela mineração ilegal do ouro na Amazônia.