Brasília, 29 de janeiro de 2025 – Os nitazenos, uma classe emergente de novos opioides sintéticos (NSOs) que vêm ganhando atenção global devido à sua alta potência, potencial de abuso e riscos associados, foram o foco de um estudo inédito apresentado pelo Escritório das Nações Unidas sobre Drogas e Crime (UNODC), em parceria com o Ministério da Justiça e Segurança Pública do Brasil e o Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD). A publicação, intitulada “Nitazenos: Caracterização e Presença no Brasil”, foi lançada no dia 24 de janeiro, em Brasília (DF).
O estudo se insere em um contexto de crescente monitoramento das Novas Substâncias Psicoativas (NSP) em escala global. Até novembro de 2024, 147 países e territórios notificaram mais de 1.250 novas substâncias ao Early Warning Advisory do UNODC. Na América Latina e no Caribe, 217 substâncias foram reportadas até dezembro de 2020, destacando a complexidade e a diversidade dessas substâncias. O Brasil, embora não registre uma epidemia de opioides como os Estados Unidos e a Europa, vem detectando um aumento nas apreensões e na circulação dessas substâncias. De acordo com o estudo, entre julho de 2022 e abril de 2023, foram analisadas 140 amostras de apreensões feitas pela Polícia Civil de São Paulo. Destas, 133 (95%) continham nitazenos. Além disso, a primeira apreensão oficial da substância em território nacional ocorreu no Aeroporto de Viracopos, em Campinas/SP, no final de 2023.
Segundo Elena Abbati, diretora do UNODC no Brasil, o estudo é uma ferramenta fundamental para antecipar desafios e fortalecer políticas públicas baseadas em evidências. “A disseminação dos nitazenos em países com estruturas de monitoramento robustas evidencia a sofisticação das redes de produção e de tráfico, que ultrapassam fronteiras e se adaptam rapidamente às medidas de controle. Nesse sentido, o UNODC acredita que compartilhar conhecimento baseado em evidências é uma das ferramentas mais eficientes para enfrentar desafios globais.”
Depositário das três convenções sobre drogas das Nações Unidas, o UNODC desenvolve estudos e análises que oferecem subsídios técnicos para o aprimoramento de políticas públicas baseadas em evidências, além de apoiar governos na formulação de estratégias eficazes para mitigar os impactos das drogas ilícitas na sociedade. O Escritório também colabora com o fortalecimento de programas de prevenção, capacitação profissional e desenvolvimento social comunitário, promovendo abordagens integradas e internacionalmente reconhecidas para reduzir os riscos associados ao uso de substâncias psicoativas.
O Brasil apresenta uma baixa circulação e diversidade de opioides ilícitos em comparação com outros países, mas as apreensões dessas substâncias vêm se tornando mais frequentes. A forma mais comum da substância no país é o Metonitazeno, geralmente encontrado em vegetal seco e fragmentado, sugerindo consumo por inalação (fumada). Além da Polícia Federal, três estados já identificaram nitazenos: São Paulo, Minas Gerais e Santa Catarina. A apreensão mais recente ocorreu em Mogi das Cruzes/SP, em dezembro de 2024, onde foram identificados 280 g de material em pó e 41,3 kg de ervas contendo nitazenos.
No cenário internacional, os nitazenos têm sido detectados em diversos países desde 2019. Os países que mais reportaram novas moléculas ao UNODC foram Estados Unidos, Canadá, Letônia, Estônia, Reino Unido, Suécia e Alemanha. O estudo aponta uma tendência de expansão global dessas substâncias, com predominância na Europa e na América do Norte. O aparecimento contínuo dessas moléculas sugere uma rápida disseminação internacional, o que exige maior atenção das autoridades.
Os nitazenos são derivados do 2-benzilbenzimidazol e foram originalmente sintetizados na década de 1950, com potencial uso analgésico. No entanto, nunca chegaram a ser comercializados como medicamentos devido ao alto potencial de abuso e risco de dependência. Sua aparição no mercado ilícito de drogas foi registrada pela primeira vez em 2019. São substâncias centenas ou milhares de vezes mais potentes que a morfina e outros opioides, o que eleva significativamente os riscos de overdose e fatalidades. Entre os principais efeitos adversos, destacam-se tontura, náusea, desorientação e convulsões, além do alto risco de depressão do sistema nervoso central e respiratório, possibilidade de parada cardíaca e elevado potencial de dependência.
Segundo Marta Machado, titular da Secretaria Nacional de Políticas sobre Drogas e Gestão de Ativos (SENAD), a ameaça dessas substâncias exige vigilância constante. “Apesar de não haver indicativos de uma epidemia de uso de opioides no país, a questão é preocupante pela potência e pelos perigos relacionados. É fundamental que haja monitoramento constante e proativo no que se refere à comercialização e ao uso ilícitos dessas substâncias, para enfrentar uma possível escalada da situação.”
O estudo ressalta que o Brasil já implementou uma série de ações para monitorar e responder ao avanço das novas substâncias psicoativas. Entre as iniciativas, destaca-se a criação do Sistema de Alerta Rápido sobre Drogas (SAR), um mecanismo essencial para identificar e notificar novas substâncias. Além disso, o país investiu na reconstrução do Observatório Brasileiro de Informações sobre Drogas (OBID), reforçando o monitoramento de dados e ampliando as bases de conhecimento sobre o tema.
O UNODC também se uniu à SENAD no fortalecimento de seu Sistema de Alerta Rápido, apoiado por meio dos projetos do UNODCque trabalham com o tema das novas drogas sintéticas para ampliar a capacidade de monitoramento, melhorar a troca de informações entre países e fortalecer a resposta às novas substâncias sintéticas, incluindo os nitazenos.
Outro ponto relevante é a capacitação de peritos em diferentes regiões do Brasil, o que tem sido fundamental para aprimorar a identificação dessas substâncias e fortalecer a resposta do sistema de justiça. A modernização dos laboratórios de perícia dos estados brasileiros também tem sido um passo estratégico para garantir maior precisão nas análises forenses e facilitar a identificação de novas substâncias que possam representar riscos à saúde pública.
A publicação “Nitazenos: Caracterização e Presença no Brasil” reforça a importância do monitoramento contínuo e da formulação de políticas públicas baseadas em evidências para prevenir e mitigar os riscos dessas substâncias no Brasil. Diante da tendência global de expansão dos nitazenos, o estudo recomenda ações coordenadas e integradas entre governo, agências internacionais e sociedade civil para ampliar a vigilância, fortalecer redes de detecção e mitigar riscos à saúde pública.
Acesse aqui o sumário executivo e o estudo completo“Nitazenos: Caracterização e Presença no Brasil”
CDESC – Centro de Estudos sobre Drogas e Desenvolvimento Social Comunitário:O Centro de Estudos sobre Drogas e Desenvolvimento Social Comunitário – CDESC foi criado com a missão de apoiar as políticas públicas da Secretaria Nacional de Políticas sobre Drogas e Gestão de Ativos (SENAD) do Ministério da Justiça e Segurança Pública (MJSP), englobando estratégias inovadoras voltadas para a promoção do desenvolvimento sustentável.Uma das principais atividades do CDESC é a elaboração de pesquisas e estudos que trazem à tona informações qualificadas sobre drogas e desenvolvimento social comunitário. Com base nesses dados, atua-se para influenciar decisões estratégicas humanas, inclusivas e alinhadas com as necessidades da sociedade.