Brasília, 5 de outubro de 2021 - As audiências de custódia, inclusive com uma perspectiva comparada com outros países, foram expostas no painel “Audiências de Controle de Detenção nas Américas”, no 3º Fórum Nacional de Alternativas Penais (Fonape). Dos 35 países membros da Organização dos Estados Americanos (OEA), 27 possuem a previsão da audiência de custódia.
Para o diretor do Centro de Estudos de Justiça das Américas (CEJA) Leonel Postigo, o Brasil deve discutir com urgência reformas necessárias no sistema penal que já são adotadas em outros países da América Latina.
O juiz do Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP) Rodrigo Tellini ressaltou a eficiência dos centros de alternativas penais brasileiros para o controle de detenção. “Os centros de alternativas penais servem como pontes de inclusão social para aquele que comete o delito tendo como causa subjacente a drogadição, o desamparo ou o desemprego e com isso contribui com a grande possibilidade de promover a reconstrução dos laços entre a sociedade e o indivíduo tido como infrator.”
Nesse painel, ainda teve o lançamento do Sumários Executivos de quatro Manuais Técnicos de qualificação das audiências de custódia lançados pelo programa Fazendo Justiça em 2020. Há versões em português inglês e espanhol.
Debates simultâneos
Na sequência da programação, três salas temáticas e simultâneas foram abertas. A primeira delas, sob o tema “Prendendo os pobres? O lugar da proteção social logo após a detenção” contou também com o lançamento de material informativo para pessoas custodiadas, elaborado pelo CNJ, no âmbito do programa Fazendo Justiça, em parceria com o Escritório das Nações Unidas sobre Drogas e Crime (UNODC).
Integrante da Frente Estadual pelo Desencarceramento no Rio de Janeiro, Eliene Vieira, ao falar sobre a seletividade penal como produto do racismo, pontuou que o Estado não pode ser o provocador de violações e sofrimento. “É preciso tratar as pessoas com dignidade. O Estado prefere investir em poder bélico a construir políticas promotoras de direitos humanos e cidadania.”
A juíza do Tribunal de Justiça de Minas Gerais (TJMG) Solange de Borba Reimberg, compartilhou as experiências de práticas de Justiça Restaurativa realizadas em Patos de Minas. “A responsabilidade sobre o estado de coisas institucional recai sobre todos os poderes e instâncias federativas”.
A supervisora de proteção social do UNODC, Nara de Araújo, apontou a importância do serviço de atendimento à pessoa custodiada na aproximação do judiciário com as políticas de proteção social. “É necessária e urgente uma transposição para a lógica do cuidado, da prevenção e da inclusão social.”
Dados e transparência
A mesa temática sobre dados foi iniciada com Michael Williams, do Pew’s Public Safety Performance Project. Ele afirmou que o trabalho de 12 anos da organização para reduzir o número de pessoas encarceradas a partir de políticas baseadas em evidências vem gerando resultados – atualmente os Estados Unidos gastam cerca de 100 bilhões de dólares para manter seu sistema penal. “Criamos políticas de segurança publica com foco no controle de gastos para que esse dinheiro tenha maior custo benefício. Vários estados já fizeram reformas bipartidárias, e reinvestir em programas de prevenção vem obtendo resultados melhores.”
No painel, foram lançados dois cadernos de dados produzidos pelo UNODC no contexto do programa Fazendo Justiça, com análise de dados da porta de entrada do sistema prisional durante a pandemia. A análise ocorreu no contexto de suspensão das audiências de custódia em grande parte do país.
Vinicius Couto, supervisor em dados e informações do UNODC, apresentou os materiais, que também foram comentados pelo juiz do Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF4), Marcelo Cardozo da Silva, que falou sobre a prisão em flagrante como porta de entrada da justiça criminal.
Raça e Justiça criminal
A necessidade de uma agenda transformadora para erradicar o racismo sistêmico foi a tônica do diálogo da abertura da mesa sobre o tema, que contou com dados de recente relatório do Alto Comissariado da ONU para os Direitos Humanos (ACNUDH). “É um convite para uma resposta também sistêmica, que exige o engajamento de toda a sociedade e suas instituições”, pontuou a assessora do ACNUDH Angela Pires.
Para a promotora de Justiça da Bahia, Livia Vaz o debate sobre a aplicação de alternativas penais demanda investimentos para um letramento racial do sistema de justiça. “Sem a extinção dos funis raciais que promovem a criminalização e a seletividade penal, não se muda as práticas na área”, afirmou. Foi o que também reforçou a advogada criminalista Soraia Mendes. “Para além de leis em seu caráter simbólico, é preciso que a proteção penal venha de uma modificação estrutural do sistema de justiça em suas diversas interfaces.”
O assessor de coordenação do UNODC, Igo Ribeiro lembrou que desafios e oportunidades de atuação na área estão na agenda de trabalho do programa Fazendo Justiça.
3º Fonape
O evento integra as atividades do programa Fazendo Justiça, parceria entre o CNJ e o Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD), com apoio do Departamento Penitenciário Nacional (Depen), que trabalha 28 ações simultâneas para a superação de desafios no campo da privação de liberdade. O programa tem ainda a parceria do UNODC nas ações sobre audiência de custódia.
Conheça a programação completa do 3º Fonape
Com informações da Agência CNJ de Notícias
Para saber mais: http://www.agenda2030.com.br/