Simpósio Internacional para o Enfrentamento ao Tráfico de Pessoas
Discurso Bo Mathiasen
Senhoras e senhores,
É com grande satisfação que represento neste encontro o Escritório das Nações Unidas sobre Drogas e Crime, o UNODC, organismo responsável por apoiar os países no cumprimento do protocolo relativo ao tráfico de pessoas e na construção de uma resposta global a esse tipo de crime.
Quero começar parabenizando o Conselho Nacional de Justiça, o Tribunal de Justiça de Goiás e a Secretaria Nacional de Justiça pela iniciativa de reunir diversas categorias de operadores do Direito e integrantes do Poder Judiciário em uma das cidades brasileiras mais afetadas por este tipo de crime.
Sabemos que o tráfico de pessoas é um crime de dimensões globais, que atinge milhões de pessoas no mundo inteiro e que se caracteriza pela exploração da vulnerabilidade humana para extrair dela os seus lucros.
Lamentavelmente, o tráfico de pessoas vem aumentando de forma assustadora nos últimos anos. A globalização democratizou o acesso a lugares antes inimagináveis, facilitou nossas vidas, mas também introduziu uma nova dinâmica no crime organizado.
A falta de igualdade, justiça social e, em muitos casos, de segurança, aliadas ao endurecimento das políticas migratórias, apenas criaram novas oportunidades para o crime organizado. Os criminosos buscam obter lucros explorando pessoas que, em momentos de dificuldade, se agarram a qualquer esperança.
Nossas estimativas mostram que o tráfico de pessoas representa lucros que ultrapassam os 30 bilhões de dólares e que atinge mais de 2,4 milhões de pessoas no mundo inteiro.
Só na América Latina, esse número é estimado em cerca de 700 mil vítimas. No Brasil, a maioria das vitimas são de estados como Goiás, Minas Gerais, Pernambuco, Rio de Janeiro e São Paulo.
Uma resposta mundial mais efetiva para o tráfico de pessoas começou há 8 anos, com a entrada em vigor da Convenção contra o Crime Organizado Transnacional, em Palermo, e o Protocolo para Prevenir, Reprimir e Sancionar o Tráfico de Pessoas, especialmente mulheres e crianças.
Desde que a Convenção entrou em vigor, o UNODC trabalha em prestar assistência técnica aos Estados Membro em três áreas chave - na prevenção ao tráfico de pessoas, na proteção às vítimas, na persecução penal de criminosos e na cooperação internacional.
Entre as ferramentas que o UNODC oferece estão publicações relevantes para apoiar os países no enfrentamento desse crime, como o Manual sobre Tráfico de Pessoas para Praticantes de Justiça Criminal, o Quadro de Ação Internacional para a Implementação do Protocolo contra o Tráfico de Pessoas e O Papel da Corrupção no Tráfico de Pessoal.
Outra publicação fundamental para entender esta forma de crime organizado é o Relatório Global sobre Tráfico de Pessoas. Lançado pela primeira vez em 2009, este relatório terá sua segunda edição, a ser lançada em dezembro deste ano, e por decisão dos Estados Membros será uma publicação permanente do UNODC, com edições atualizadas a cada dois anos.
Tampouco posso deixar de mencionar a criação do Case Law Database, uma iniciativa online do UNODC e tema de uma iniciativa que está sendo lançada hoje pelo Conselho Nacional de Justiça, a Secretaria Nacional de Justiça e o UNODC.
O Case Law Database é uma ferramenta virtual criada em outubro de 2011 pelo UNODC com vistas a construir um banco de dados global de decisões judiciais sobre tráfico de pessoas. O banco de dados possui detalhes sobre a nacionalidade das vitimas e dos criminosos, as rotas do tráfico, as decisões judiciais e outras informações sobre casos no mundo inteiro. O objetivo é que juízes, advogados, formuladores de políticas públicas, pesquisadores e partes interessadas tenham acesso a informações sobre como as legislações podem ser utilizadas para processar casos de tráfico de pessoas.
A partir desta iniciativa, será feito um levantamento de sentenças judiciais brasileiras de casos de tráfico de pessoas. A expectativa é que até outubro deste ano pelo menos 50 sentenças judiciais brasileiras sobre o tema passem a integrar o Case Law Database do UNODC.
Para alcançar esta meta, no entanto, é preciso que a iniciativa conte com a colaboração de outros órgãos que lidam com o tema, como a Procuradoria Geral da República, o Departamento da Polícia Federal, entre outros.
Sabemos que o tráfico de pessoas é uma das formas mais cruéis do crime organizado e que não é possível avançar no seu enfrentamento sem uma base legal abrangente e sólida, capaz de oferecer as ferramentas necessárias para punir com rigor toda a cadeia de criminosos envolvidos.
Nesse sentido, o Brasil tem demonstrado o seu desejo de avançar. A iniciativa do Governo Federal de propor a criação de uma lei específica sobre tráfico de pessoas e de reformar o Código Penal servirá para tornar a luta contra o crime organizado transnacional mais eficiente.
Só é possível enfrentar o crime organizado transnacional se os criminosos tiverem a percepção de que o risco de serem punidos existe de fato.
Também é importante que os países se comprometam com a cooperação internacional.
Somente por meio do intercâmbio de experiências e de informações, da harmonização legislativa e do trabalho conjunto vamos conseguir enfrentar o crime organizado transnacional.
O tráfico de pessoas é uma das formas do crime organizado transnacional e é um desafio global que demanda respostas em todos os níveis - local, regional, nacional, inter-regional e global.
Mas para que isso ocorra é preciso garantir o comprometimento de todos os setores da sociedade.
Muito obrigado.
13 de maio de 2012
Goiânia, Brasil