UNODC revela impacto devastador do ópio afegão em todo o mundo
21 de outubro de 2009 - O Afeganistão possui hoje praticamente o monopólio global do cultivo da papoula do ópio (92%), matéria-prima usada para a produção da droga mais mortal do mundo, a heroína. O impacto da economia do ópio no Afeganistão já havia sido documentado na Pesquisa sobre o Ópio no Afeganistão 2009, publicada em setembro. Menos conhecida, no entanto, era a dimensão do comércio dessa droga depois de deixar o Afeganistão, e seu impacto no mundo.
Nesse sentido, um novo relatório, intitulado Adição,
Crime e Insurgência: o Comércio Transnacional do Comércio do Ópio Afegão, publicado pelo Escritório das Nações Unidas sobre Drogas e Crimes (UNODC), mostra as consequências devastadoras que 900 toneladas de ópio e 375 toneladas de heroína, traficadas pelo Afeganistão anualmente, relacionadas à saúde e à segurança nos países-rota como os dos Bálcãs e da Eurásia, além da Europa, da China, da Índia e da Federação Russa.
O relatório documenta como a droga mais mortal do planeta criou um mercado que movimenta 65 bilhões de euros anualmente, com cerca de 15 milhões de dependentes, e que causa mais de 100 mil mortes por ano, espalha o vírus HIV em taxas elevadas e, além disso, financia grupos criminosos, insurgentes e terroristas.
O relatório documenta como a droga mais mortal do planeta criou um mercado que movimenta 65 bilhões de euros anualmente, com cerca de 15 milhões de dependentes, e que causa mais de 100 mil mortes por ano, espalha o vírus HIV em taxas elevadas e, além disso, financia grupos criminosos, insurgentes e terroristas.
"Nós identificamos as consequências globais relativas ao comércio do ópio afegão. Algumas são devastadoras, mas esperadas. Outras parecem surpreendentes, ainda que bastante reais. Peço que os apoiadores do Afeganistão reconheçam que, em grande medida, essas verdades desconfortáveis podem ser resultado de uma negligência benigna", disse o Diretor Executivo do UNODC, Antonio Maria Costa, no lançamento do novo relatório.
Grande quantidade de uso do ópio, pequena quantidade apreendida
As conclusões do relatório revelam algumas irregularidades. Uma delas é a incongruência entre a grande quantidade de heroína consumida e o pequeno índice de apreensões. Aproximadamente 40% a droga produzida no Afeganistão é traficada anualmente para o Paquistão. Cerca de 30% entra no Irã e 25% vai para a Ásia Central. No Afeganistão, a corrupção, a ilegalidade e a falta de controle nas fronteiras resultam em insignificantes 2% de interceptação na rota da produção de ópio, comparado a, por exemplo, 36% da cocaína na Colômbia.
De acordo com Costa, "as fronteiras do Afeganistão e do Paquistão se tornaram a principal zona livre de comércio mundial no tráfico de qualquer produto ilícito: por lá passam as drogas, é claro, mas também armas, componentes de produção de bombas, precursores químicos, dinheiro sujo e até pessoas e migrantes".
Taxas de interceptação declinam fora do Afeganistão, enquanto o valor das drogas aumenta
A segunda irregularidade exposta no relatório encontra-se fora do Afeganistão. As taxas de interceptação estão diminuindo ao passo em que se aproximam de mercados maiores e mais lucrativos. Enquanto a o Irã intercepta 20% e o Paquistão 17% de opiáceos que atravessam seus territórios, os estados da Ásia Central interceptam apenas 5%. Essa porcentagem na Federação Russa é de apenas 4%. Países do sudeste da Europa, incluindo membros da União Européia, como Bulgária, Grécia e Romênia, interceptam somente de 2% desse comércio
"Interceptar o ópio no Afeganistão, onde ele é produzido, é infinitamente mais eficiente e mais barato do que tentar fazê-lo quando ele é consumido", disse Costa, pedindo mais recursos para combatero problema na sua origem, ou seja, no Afeganistão e nos seus arredores. "Esta não é apenas uma responsabilidade compartilhada: é um trabalho difícil de interesse de todos", disse Costa.
Talibã ganha mais dinheiro hoje do que há dez anos
A terceira irregularidade é o significativo aumento financeiro advindo da produção de drogas pelo Talibã, em relação à década de 90, quando estava no poder. O relatório mostra que há dez anos o grupo ganhava de 75 a 100 milhões de euros por ano através da tributação de cultivo de papoula. Desde 2005, o Talibã e outros insurgentes do Afeganistão têm lucrado entre 90 e 160 milhões de euros por ano cobrando pela e pelo comércio de ópio um dízimo conhecido como ushr.
Os recém criados carteis de droga dentro e ao redor do Afeganistão estão deturpando a separação entre cobiça e ideologia. "Alguns especuladores no comércio de heroína vestem ternos e colarinhos brancos, já outros usam turbantes negros", disse o chefe do UNODC. "Muitos destes barões da droga, ligados à insurgência, são conhecidos por serviços de inteligência afegãos e estrangeiros. Por que seus nomes não foram apresentados ao Conselho de Segurança, como exigido pelas resoluções 1735 e 1822, a fim de proibir viagens e confiscar seus bens?", questiona Costa.
Duplo sentido dos fluxos de droga afegã
O duplo sentido dos fluxos de droga afegã é por vezes esquecido. Existem as quantidades físicas da droga, toneladas de ópio e heroína, que causam estragos à saúde em países consumidores. A aplicação da lei concentra-se sobre estes fluxos. Entretanto, há também os fluxos de valor, ou seja, o dinheiro gerado por criminosos e insurgentes envolvidos. "A tempestade combinada de drogas e do terrorismo, que atingiu as fronteiras do Afeganistão e Paquistão durante anos, pode estar caminhando para a Ásia Central. Uma grande parte da região pode se envolver em terrorismo em grande escala, pondo em risco os seus enormes recursos de energia", adverte o chefe do UNODC.
Mais mortes de drogas em casa do que no campo de batalha
Por mais incrível que possa parecer, o custo humano da dependência nos países consumidores é maior do que o número de soldados mortos nos campos de ópio do Afeganistão. Por exemplo, em países da OTAN, o número de pessoas que morrem de overdose de heroína por ano (mais de 10.000) é cinco vezes superior ao número total de oficias que foram mortos no Afeganistão nos últimos oito anos.
Mais oferta do que procura
Outra irregularidade é um fato amplamente conhecido desde 2006: a produção do ópio no Afeganistão é muito maior do que o consumo mundial. O relatório confirma que existe hoje um arsenal de reserva de 12 mil toneladas de ópio afegão, o suficiente para satisfazer por mais de dois anos a demanda de heroína mundo. "Com tanto ópio nas mãos de pessoas de má índole, a necessidade de localizar e destruir esse estoque é mais urgente do que nunca" disse Costa.
Uma última irregularidade apontada pelo relatório se refere à relação está relacionada ao mercado ilícito de drogas e ao consumo. Os números nem sempre fecham. Por exemplo, a Índia, apesar de ter 800.000 dependentes, não informa qualquer aumento de ópio bruto. Ou grandes quantidades de produção nacional licenciada estão sendo desviadas (a papoula do ópio é também cultivada ilegalmente na Índia), ou o ópio afegão está chegando à região.
Os governos precisam abordar todos os elos da cadeia
O relatório Adição, Crime e Insurgência oferece uma perspectiva mais ampla e profunda no que se que se refere à cobertura geográfica do trabalho anterior do UNODC no Afeganistão. "Os números são assustadores", disse Costa, "Ainda mais assustador é o fato de que os governos ainda não perceberam que só podem enfrentar o desafio abordando todos os elos da cadeia: a assistência aos agricultores para reduzir a oferta, prevenção e tratamento para diminuir a demanda e aplicar a lei contra os intermediários".