Combate à corrupção: cada "não" conta
Bo Mathiasen
As notícias na imprensa mostrando o envolvimento de empresários, políticos e funcionários públicos em casos de corrupção, desvio e uso indevido do dinheiro público provocam nos cidadãos um sentimento de inconformismo e de revolta. Os desfechos sem solução de episódios passados contribuem para minar confiança da população no governo e nas instituições do país, abrindo caminho para regimes autoritários. Neste ponto, não se pode fazer concessões: simplesmente não é admissível que uma pessoa a serviço do público roube o dinheiro dos contribuintes.
Quando há corrupção, recursos que poderiam ser usados na melhoria das condições de vida das pessoas são perdidos - o que significa, por exemplo, menos serviços de saúde, de educação ou de segurança pública. Também ela gera um impacto devastador na economia, quando recursos importantes para o desenvolvimento são desviados ou mal aplicados. O Banco Mundial estima que, nos países onde os índices de corrupção são mais altos, entre 25% e 30% do PIB é desperdiçado em decorrência do problema. Já em países onde a corrupção está sob controle esses valores não ultrapassam 3%.
Os dados mais divulgados internacionalmente nesta área são os que estimam a percepção da corrupção. O mais conhecido é o ranking produzido pela ONG Transparência Internacional, que hoje posiciona o Brasil no 75º lugar em um universo de 180 países pesquisados. Entretanto, a mera percepção da corrupção tem um caráter duplo. Pode indicar um real aumento dos níveis de corrupção, ou apenas sinalizar que o aprimoramento das ferramentas de transparência e de controle esteja trazendo à luz situações antes escondidas e, por isso, desconhecidas pelas pessoas.
Vários casos recentes de desvio ou de mau uso de verbas públicas no Brasil foram descobertos devido ao acesso público ao Portal da Transparência, desenvolvido pela Controladoria-Geral da União (CGU). Essa iniciativa é considerada internacionalmente um exemplo de transparência no controle dos gastos públicos. Todavia, o Portal da Transparência está, de certa forma, relacionado ao aumento da sensação de corrupção. O mesmo se aplica ao trabalho realizado pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ), que está trazendo transparência ao Poder Judiciário.
Para minimizar a corrupção, é preciso combinar ações de repressão e de prevenção. Os corruptos não podem operar em um ambiente de impunidade que estimule esse comportamento. É preciso tratá-lo como um criminoso comum, que se apropriou de bens públicos.
Paralelamente, é preciso desenvolver nas pessoas uma cultura ética de intolerância à corrupção. Cada cidadão deve chamar para si a responsabilidade de combater a corrupção, não apenas na política ou no meio empresarial, mas ampliando essa postura para seu dia-a-dia, agindo de maneira correta mesmo nas situações cotidianas.
Afinal, a corrupção é um fenômeno social que envolve desde atos quase invisíveis, como o pagamento de propina a um guarda de trânsito, até crimes de grande impacto na vida de milhares de pessoas, como o desvio de recursos públicos para compra de medicamentos, por exemplo.
É nesse sentido que o Escritório das Nações Unidas sobre Drogas e Crime (UNODC) lançou a campanha global "corrupção: cada não conta". Se todos percebermos a importância de dizer "não" a pequenos atos de corrupção, seremos capazes de mudar a sociedade. O Dia Internacional contra a Corrupção, no dia 9 de dezembro, é uma oportunidade para refletir sobre o assunto e reafirmar o compromisso de acabar com a cultura da corrupção.
Bo Mathiasen, dinamarquês, é o representante do Escritório das Nações Unidas sobre Drogas e Crimes (UNODC) para o Brasil e o Cone Sul. É mestre em Ciência Política e Economia pela Universidade de Copenhague e especialista em Desenvolvimento Econômico pela Universidade do Estado do Rio de Janeiro.
04-12-2009